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Cavalete Andante: uma nova expressão artística

Atualmente a cultura alternativa vem ganhando espaço no meio artístico da sociedade contemporânea. A arte não está mais somente em quadros, nas galerias ou museus, hoje é possível encontrá-la estampada nos muros, nas paredes dentro de casas, em postes, entre outros, e isso atrai o interesse de diversas pessoas e ganha cada vez mais destaque e valorização.

Foi na tentativa de buscar uma nova estética que os artistas plásticos, Bruno A. Pereira Macedo, conhecido como Bruno Perê, que desenvolve trabalhos artístico-pedagógicos voltados à resistência cultural e Jardélio Santos que realiza atividades em espaços diferenciados para promover um estilo novo de expressão, desenvolveram o projeto conhecido como Cavalete Andante.

O objetivo do projeto é levar a arte e a pintura sobre tela para lugares públicos, dialogando com o espaço local e provocando, desta forma, uma intervenção cultural, por meio de processos pictóricos em diferentes suportes, entre eles a madeira e a tela.

A ideia surgiu em dezembro de 2009, enquanto os dois artistas realizavam algumas atividades na Praça Zumbi dos Palmares na Vila Nova Cachoeirinha, com programas que envolviam poesia, grafite, pintura, música e projeções, foi em uma dessas ocupações que Jardélio, ao levar um cavalete de pintura, chamou a atenção da garotada do bairro que se interessou pela novidade. A partir daí, os artistas decidiram criar o projeto Cavalete Andante.

As atividades realizadas por meio do Cavalete Andante passaram a ser chamadas de intervenção-oficina. “A proposta sempre foi permitir com que as pessoas participassem de forma espontânea, com liberdade para explorar as tintas, sobre os suportes encontrados pela praça” declarou Bruno que não pretende dar aula e nem criar um “espaço rígido” durante as aplicações das oficinas. “Procuramos o movimento e novos lugares físicos e criativos que nos tirassem do lugar da pintura convencional com portas fechadas e pregada na parede. A nossa intervenção está na relação com o outro, e dessa relação com o espaço”, completou ele.

Como projeto foi desenvolvido na rua, o foco principal é permitir que as pessoas utilizem o local para desenvolver trabalhos buscando o questionamento e a experimentação da criação e dessa forma descobrir outras possibilidades de compartilhar os processos artísticos. Como explicou Jardélio, “O projeto sensibiliza e traz à tona perspectivas muito diversa. Mostrar como um mesmo cenário pode desembocar em expressões plásticas bastante particulares e diferentes entre si traz à tona uma série de reflexões importantes”.

Paulo O. Meira, também artista plástico, acompanhou indiretamente o desenvolvimento do projeto. Ele aponta que além do trabalho artístico, existe também o lado da questão social, pois permite que as pessoas de comunidades tenham um contato com a pintura, com os artistas e educadores ajudando-as a adquirir conhecimento.

“O projeto agrega conhecimento nas relações entre as pessoas, suas vivências, trocas de informações, levando o acesso à cultura para que as pessoas conheçam um pouco da ferramenta e quem sabe sejam multiplicadores desta ação.” afirmou Paulo.

Geovana Held Ragazi,técnica em design gráfico, participou da oficina, na qual segundo ela, ajudou a aperfeiçoar a visão sobre diversos aspectos, inclusive em relação ao aprimoramento da profissão e experiências enriquecedoras. “Gostei bastante dessa liberdade de poder andar com o cavalete debaixo do braço. Achei interessante eles levarem arte e conhecimento para esses espaços, buscando um público diferenciado,” disse a designer.

Járdelio e Bruno se sentem gratificados com o projeto Cavalete Andante, devido a troca de experiências e acredita que o contato das pessoas com esta nova perpectiva sobre a pintura ajuda no desenvolvimento de um novo olhar. “Experimentar, sentir a matéria das cores, o olhar criativo a procura de novas formas e novos horizontes para compor o trabalho, traz um grande aprendizado vivenciado e praticado na oficina,” concluiram os propositores do projeto.


Guerra e Paz

Faz uma semana que passei em frente ao Memorial da América Latina e vi uma fila imensa para ver a exposição Guerra e Paz de Candido Portinari. Por maior que fosse o tamanho da fila, ainda seria pequena em comparação a grandeza da obra que estava exposta no local.

Confesso que de início não esperava muito, apesar da repercussão que a mídia fez sobre o evento, mas ao entrar naquela sala fiquei vislumbrada. Simplesmente magnífico. Os detalhes, a grandeza, o trabalho, as características, o resultado e a consequência depois de tanta dedicação àqueles painéis. Tudo tão esplendoroso.

“As coisas comoventes ferem de morte o artista e sua única salvação é retransmitir a mensagem que recebe. Eu pergunto quais as coisas comoventes neste mundo de hoje? Não são por acaso as tragédias provocadas pelas guerras, as tragédias provocadas elas injustiças, pela desigualdade e pela fome? Haverá na natureza qualquer coisa que grite mais alto ao coração do que isso?…” trecho do discurso de Portinati a intelectuais e artistas em Buenos Aires, em 1947.

A Criação

Os dois maiores painéis foram pintados por Portinari entre 1952 e 1956 a pedido do governo brasileiro para presentear a ONU. A obra fica em local restrito, por isso o desejo de que elas fossem expostas aqui no Brasil.

Foram mais de 100 estudos preparatórios para a produção do Guerra e Paz que revelam a preocupação do autor com os detalhes característicos de cada obra.

Paz

Guerra

 

No painel Guerra é possível observar a predominância de tons escuros, principalmente da cor azul que, passando por toda a sua escala de tonalidades, retrata a tristeza, a dor, o sofrimento, a morte, ora na dor da mãe que perde o filho, ora nos cavaleiros apocalípticos.

A Paz vem retratada na leveza dos tons pastéis, particularizada pelo dourado, o pintor mostrar a alegria, a vida, a harmonia, a paz na ciranda, no canto e nas brincadeiras das crianças, no trabalho produtivo.

Os painéis foram restaurados entre fevereiro e maio de 2011, no Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro. Possui 14 metros de altura por 10 metros de largura cada um. São compostos por 28 placas de madeira com 2,2 metros de altura por 5 metros de largura.

O Criador

Candido Portinari nasceu no dia 30 de dezembro de 1903, na cidade de Brodowski, no estado de São Paulo. Com 15 anos mudou-se para o Rio de Janeiro.

Não apostou na educação escolar, mas conseguiu se tornar um dos mais famosos pintores das Américas graças ao seu talento. Dizem que começou o seu trabalho seguindo o conselho de Tolstoi, “se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia…”.

Mesmo avisado pelos médicos sobre o risco a saúde que o trabalho traria, o pintor não recuou e completou o maior desafio da sua vida, pintar Guerra e Paz. Portinari faleceu em 6 de fevereiro de 1962 intoxicado por sua matéria prima.

Quando eu visitei a exposição não havia muitas pessoas na fila, mas tenho certeza que para os que esperaram embaixo do sol ou no frio, horas e horas, saíram com a certeza que o esforço valeu a pena. Para aqueles que não viram, fica a esperança de um dia terem esse privilégio.

A Guerra e a Paz de Portinari

“A guerra é uma cavalgada
cruzando o azul da paisagem
cortejo de fome e de morte
ferindo o coração dos homens.
A mulher velando o filho morto
a mulher e a criança chorando
a mãe e a filha em desespero
de cabeças rolando na grama.
A guerra são os quatro cavalos
regendo a sinfonia de dores
são os braços erguidos em prece
pedindo o final dos horrores.
A paz é um coro de meninos
é a voz eterna da infância
as mulheres dançando na roça
os meninos pulando carniça.
É a noiva de branco sorrindo
na garupa de um cavalo branco
a mulher carrega um carneiro
crianças no espaço balançam.
A paz está nos meninos
que brincam nos campos da infância
nos homens, nas mulheres cantando
a harmonia, a esperança.”

Fernando Brant